Secretária do PT no Amazonas revela aval de R$ 58 milhões para eleger aliados em 2024

Informação publicada pelo Estadão, nesta segunda-feira, 10, traz revelações sobre a suspeita de beneficiamento de aliados do Partido dos Trabalhadores (PT) nas eleições de 2024, pelo Programa Nacional de Comitês de Cultura (PNCC), criado em 2023, e que teve aporte de R$ 58 milhões.

A fala teria sido extraída em gravações feitas por ex-aliado da então candidata a vice-governadora nas eleições de 2022, atual secretária nacional das mulheres, Anne Moura.

Nas gravações, Anne Moura exige que comitê de cultura do Amazonas privilegie ‘artistas parceiros combinados na política’ e afirma que cúpula do Ministério da Cultura autorizou PNCC em ‘ajuda’ a campanhas eleitorais de 2024.

Após a repercussão, secretária nacional de Mulheres do PT, veio a público para rebater as críticas feitas a ela após a divulgação de gravações que sugerem o uso político dos Comitês de Cultura, criados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e pela ministra Margareth Menezes.

Os áudios, registrados pelo ex-presidente do Comitê de Cultura do Amazonas, Marcos Rodrigues, com quem Anne Moura (PT) rompeu politicamente no final de 2023, foram divulgados pelo jornal O Estado de S. Paulo nesta segunda-feira (10).

Uso eleitoral dos Comitês de Cultura

Criado em setembro de 2023, o Programa Nacional de Comitês de Cultura (PNCC) tem o objetivo de impulsionar a mobilização, formação e apoio a artistas em todo o país, com um orçamento de R$ 58,8 milhões até o final de 2025. No entanto, os áudios indicam que sua estrutura foi usada para fins eleitorais.

Em uma das gravações, Anne Moura cobrou de Marcos Rodrigues o envolvimento do comitê em sua campanha para vereadora de Manaus, na qual foi derrotada. Ela relatou que Roberta Martins, secretária do Ministério da Cultura (MinC) responsável pelo PNCC, considerou um “absurdo” a falta de apoio do comitê amazonense.

“Marcos, quando eu fui lá no MinC agora, da última vez, o pessoal me perguntou: ‘Anne, o comitê tá te ajudando?’ Eu disse: não, Roberta, não tá. Ela tava na sede do PT, na reunião e perguntou: ‘o comitê tá te ajudando? Porque nos outros lugares está tudo ajudando’. Porque eu fui pedir dinheiro também, tô pedindo ajuda para ganhar a eleição. Aí ela disse: o comitê tá te ajudando com alguma coisa nas agendas, nas atividades? O comitê não pode te dar dinheiro, mas eles podem promover atividade para te ajudar. Eles estão te ajudando?’. Eu disse: ‘Roberta, deixa eu falar uma coisa para ti. Temos acordos que não foram cumpridos. E depois que as pessoas sentaram na cadeira pagaram de doidos. Eu decidi que não vou me estressar com isso agora. Eu preciso ganhar a eleição. Então se tu puder me ajudar agora, daqui, na articulação tua e do Márcio, eu te agradeço. Depois, quero sentar e conversar com você sobre isso’.”

Escolha de artistas alinhados

Nos áudios, Anne Moura também criticou o fato de o comitê selecionar artistas para eventos culturais sem alinhamento político prévio.

“Mas é o seguinte, Marcos: quem foi lá para frente da prisão gritar de manhã, de tarde e de noite para defender o Lula fomos nós. Nós que sofremos sendo chamados de ‘ladrão’, todo mundo virou as costas para nós nos movimentos sociais. E a gente lá ‘somos do PT, vamos resistir, vamos não sei o quê…’. E agora, chega na parte boa, a gente vai ficar olhando as coisas acontecendo? Não vamos ter nenhuma opinião política nesse processo? Tudo tá de pé pela política. Só tem comitê porque tem Lula. E só tem Lula porque tem base, que somos nós. É inaceitável o que tá acontecendo, mas eu vou lutar uma luta de cada vez.”

Ligações com o Instituto IAJA

O Ministério da Cultura contratou entidades culturais para gerir os comitês nos estados, direcionando verbas públicas para suas atividades. No Amazonas, a ONG Instituto de Articulação de Juventude da Amazônia (IAJA) foi escolhida para coordenar o comitê, recebendo R$ 1,9 milhão ao longo de dois anos. A organização tem Anne Moura como uma de suas fundadoras.

Ministério da Cultura

O Ministério da Cultura negou qualquer influência de Anne Moura na escolha da ONG IAJA e afirmou que ela não teve contato com servidores da pasta.

Ao Estadão, o Ministério declarou que a secretária do PT “não é membro do comitê do Amazonas, nunca integrou sua equipe e não participou de qualquer processo relacionado ao Ministério da Cultura ou à seleção do edital de projetos”, contrariando as informações contidas nos áudios divulgados.

Outro lado

A líder política Anne Moura veio a público para esclarecer o que considera declarações distorcidas que visam prejudicar sua imagem e desmerecer sua trajetória voltada às causas sociais, especialmente no Amazonas, onde atua em prol de grupos prioritários.

Ela ressaltou que o IAJA é uma instituição que “há mais de 10 anos, executa inúmeros projetos sem nunca terem sido apontada conduta ou prestação de contas irregulares”. Segundo Anne, “esse histórico de ações contínuas e eficientes a credenciou para concorrer ao edital dos Comitês de Cultura”. Para ela, “os Comitês de Cultura têm desempenhado um papel importante na qualificação, na divulgação e no apoio a projetos de trabalhadores”.

Anne Moura afirmou desconhecer qualquer gravação de uma suposta conversa sua com o ex-presidente do IAJA. “Reuni com este senhor, mas nunca no sentido de interferir na condução administrativa do Comitê de Cultura”, declarou.

Ela explicou que diversas pessoas contribuíram para a construção da política pública que resultou na criação dos Comitês de Cultura, incluindo artistas comprometidos com a democratização do acesso da população às atividades culturais no Amazonas. Segundo Anne, “estes atores, independentemente de preferência política ou partidária, deveriam, a nosso ver, ter protagonismo nas atividades do Comitê. Isso foi exposto e não imposto como foi ventilado pelo ex-dirigente”.

Além disso, ela criticou a postura do ex-presidente do IAJA, acusando-o de conduzir o projeto de forma personalista e sem consultar os demais membros da instituição ou do Comitê de Cultura. Segundo Anne, ele “tomou decisões sem consultar os demais membros do IAJA e do próprio Comitê de Cultura, não se reportou ao Conselho Fiscal, sendo por isso questionado pelos associados e por mim, particularmente, sem que em nenhum momento tenha reivindicado qualquer tipo de benefício pessoal e muito menos ilegal”.

Entre os fatores que levaram à destituição do ex-presidente, Anne citou que “esse tipo de comportamento foi apenas um dos motivos que levaram o ex-presidente a ser destituído do cargo, além de não ter prestado contas ao Conselho Fiscal e ter acumulado denúncias de assédio moral a membros associados e colaboradores de projetos, fatos registrados em boletins de ocorrência e em procedimento interno que resultou em sua exclusão”.

Por fim, Anne Moura destacou sua trajetória de mais de 20 anos de dedicação à luta social e afirmou nunca ter se envolvido em práticas ilícitas. “Tenho mais de 20 anos dedicados à luta do povo e nunca estive ligada a prática de nenhuma ilicitude. Adotarei os caminhos legais para comprovar a lisura de meus atos e de cobrar a punição para pessoas que estão descompromissadas com a verdade e focadas apenas em projetos pessoais de poder”, concluiu.